“
O encontro é um jardim.
A
sábia tem os cabelos livres, entre cinzas e prata, aponta alguns
besouros pretos e formigas alaranjadas e diz que vê palavras entre seus
movimentos, que predizem um amor diamantino e ventura breve ao casal
pungido, que precipita lágrimas, numa admiração repentina por cabelos
prateados. Consuelo tem vincos cavados à sorriso, fala em tom de
santuário as advertências e em quase riso as coisas fartas e felizes, o
que inocula uma vontade-de-ficar-aqui no casal carente de certezas. Seu
vestido fulgura tons verdes, vinhos, calliandras e
céus aquarelados – logo os olhos visitantes ali bebericam, inebriados.
Biscoitos de nata aguardam, intactos, para serem degustados em tímidos
dez bocados. O papo ziguezagueia entre vermes e demônios brasileiros e
pequenos lamentos, de quem tateia a vida com os calcanhares, e redenções
ponderadas. Tudo importa, Consuelo diz sem piscar, fixa um e depois o
outro: diz sobre os poderes do amor, quando se suja e como será lavado -
com boca de cachoeira, vaza – traz com as mãos erguidas coisas
invisíveis de cimos divinos para pousá-las sobre as mãos do antigo
casal..., agora um novo ser de quatro braços. Besouros e formigas
dispersam, pois
as esperanças já foram comunicadas. Consuelo disfarça o frêmito, admira
a criatura de quatro pernas, corações contíguos, recém-formada, ainda
crua para lidar com as informações do futuro otimista ofertado. O antigo
casal não sabe o que faz com o corpo unido, as duas cabeças pacificadas
e próximas, mas coordenam-se até o totem do transporte público –
emoldurados pela janela da vate, que, neste momento, paira sobre o
tapete ecumênico. Aos poucos, a bolha de enlevo se desmancha, dois nós
de uma hora se desfazem, e todos percebem, sincrônicos e separados, as
bênçãos das pausas na loucura que não tarda a descabelar.
”
2020/06/01
Fred
Nenhum comentário:
Postar um comentário