domingo, 26 de julho de 2020

Um chumaço de alga marinha bruxuleia com o vento na esquina

 
Cabelos selvagens ruivo-lava chamam a atenção até dos fantasmas barbearia premium morfinando previna-se não ponha a mão no rosto fusca cinza com roda de liga leve e prancha de surf para domar itanhaém ansiedade em sete na escala richter por quatro meses e adolescente mãe e filha vendem balas de goma e hortelã cabelos esbranquiçados de adrenalina uma pandemia de dez mil megatons em moção lenta e muito sol previna-se. 


um chumaço de alga marinha bruxuleia com o vento na esquina. 
”  
 
 
 
2020/07/25  
Fred 

quinta-feira, 23 de julho de 2020

O barroco nunca arrefeceu

 
o barroco nunca arrefeceu / alienações autoconsentidas graçam / sai fumaça das chaminés das fábricas de subjetivação: / o cinema / sob demanda / em série / fábricas / meu filho torna-se uma cópia / melhorada de mim / que tipo de tecnologia é essa / ...? / ou destecnologia / e-sports de possessão de corpos / corpos consentidos / e bem pagos / o barroco nunca arrefeceu / luzes e sombras mais ensolaradas / sóis e mais sóis não destroem  sombras / expõem / um garoto / com um controle remoto / de videogame nas mãos / com os olhos mais vermelhos / tenta enfiar um plugue na terra / por que tentas isso? / porque quero controlar o mundo!  

”  
 
 
 
2020/07/21  
Fred 

Para o cérebro humano qualquer voo é voo vivido

 
para o cérebro humano / qualquer voo é voo vivido / moscas são belas e rápidas / mas põem ovos na gente! / as moscas põem ovos / e larvas nas brechas / não haverá afeto / que parará as moscas / serão moscas sempre / não nos afagarão / não serão pet / as moscas que põem ovos / e larvas nas nossas brechas / se esquecem e voam / as larvas farão buracos / como um foda-se de chumbo / e aquele que imitar uma mosca / de olhos fechados / bem visualizado / para seu cérebro / será humano e mosca / numa moscantropia / um tipo espiritual de entropia / licantropia sem lua / mas bem tropical / e dançante nas épocas de folia / nas horas apropriadas trabalhador / viverá alter ego / quantos couber / uma paródia enquanto imitador / voará outros corpos? / gentil? / se alienará de suas vilezas? / feito abelha do tamanho de zebu? / ou mosca do tamanho de capivara? / para o cérebro humano / qualquer voo será voo vivido 

”  
 
 
 
2020/07/14  
Fred 

Uma das forças

 
Cada vez mais e mais fantasmas. Migrantes, imigrantes e entregadores de toda sorte. Na rinha de galo o Azar e o Sorte carregam dinheiro nas ancas enquanto brigam eriçados. Aprendizes de feiticeiras confabulam: bruxuleiam sexo e inocência, mas medem as doses. A noite esconde corpos, mas há rostos, ombros, coxas, seios mascarados de decote, cabeleiras, suor, o resto a noite encobre nos buracos. Estrelas que se movem e desaparecem. Besourinhos lustrosos pretos assistem o rio gigantesco contornar seus corpos e rugir. Uma gangue de ratos encurrala um escorpião que já derrubou um. Onças-pretas invisíveis espreitam. Sombras acabam cedendo. Um pulmão explode por perto, e logo mais ganhará sono de recompensa. Humanoides são uma das forças da natureza. 

”  
 
 
 
2020/07/10 
Fred 

O planeta refulge azul pelo espaço sideral

 
Uma videoconferência põe rédeas numa centena de desencantados e lívidos. Trancas e cadeados. Quilômetros de músculos encurtados por falta de alongamento. Açúcares polimorfos. Uma família se excita por um colete à prova de balas. Pornografia em 12x, com juros no cartão. A Antroposfera pari 10.000 gêmeos todos os dias. Tempestades peristálticas. Faltam só doze meses para o carnaval. Na Alameda Glete e na Alameda Barão de Piracicaba panelas de pressão explodem os quarteirões. Robôs caseiros cheios de conduítes expostos. O Verão acaba de embelezar milhares de desencantos. O planeta refulge azul pelo espaço sideral. Um óvulo é fecundado e parece uma lâmpada acesa. 
”  
 
 
 
2020/07/09  
Fred 

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Que paz

 
Uma dj faz sim com a cabeça de olhos fechados, seu rosto varia de cor, todos dançam, uma mandala solar tem os raios em forma de triângulos e asas e está em posição que serve de aura para a dj. Seu rosto varia de cor. Sua cabeça continua fazendo sim, de olhos cerrados. Que paz! - que chega a fazer angústia em quem dança - um anjo-sísifo, que sempre chega e nunca pousa. Fecho os olhos. Tapo os ouvidos. Respiro. E meu pulmão entra em ritmo de pulmão. Ressoa uma tigela de cristal conjurada da memória. A ventoinha do computador faz silêncio. A vertigem estomacal arrefece. Uma Mariposa albina aparece da parede branca, da beleza dum talismã. É suficiente por hoje. Encolho. Encolho até ficar em paz. Um minimalismo protetor serve de pele para meu espírito. Grato. Boa noite, Universo. Dormir é uma mortezinha perfeita, é um pouquinho, uma delícia. 
" 
 
 
 
2020/07/08  
Fred

Urubus e os zepelins

 
O céu cinza arrota alguns trovões. Um cidadão zumbi-vivo ataca um zumbi-morto, de carnes podres – e quem vê expressa a vertigem em tremedeiras, no rosto, em cambaleios e tropeços. Tudo vira lentidão. Urubus que já sacavam a situação atacam as carnes podres. E aqueles que mordem os zumbis-mortos sentem o gosto podre na boca e percebem que não eram fantasias ou comunistas – e se desesperam, enxaguam a boca, correm para tomar banho, inventam, criam notícias falsas, gritam, cospem, trancam suas portas. Os urubus surgem em revoadas. Os urubus mordem zumbis-mortos e mordem os zumbis-vivos que atacaram ou morderam carnes podres. Ninguém sabe de onde saem e vem os urubus. Urubus de envergadura, harpias e gaviões, surgem. Urubus recebem graças, tangem aviões e zepelins, recebem as mesmas graças da Geni. Os urubus brilham e bicam implacáveis. Os urubus comem e bicam carnes podres. Benditos urubus. Que de tão grandes formam um grande cobertor. E salvam todos nós.  
 
 
 
 
200/07/?? 
Fred

Um algoritmo em nuvem

 
De alguma maneira puder ver, por uma nesga generosa do Tempo, uma pequena nuvem de partículas furta-cores perto de minha boca, e depois desaparecendo nas imediações de meus lábios, num formigamento breve, pinicando, porque entrava pelos poros e mucosa: um algoritmo em nuvem. A missão, cumprida, era contrair os músculos do meu rosto em forma de um sorriso sincero. Resisti o quanto pude. Saiu um sorriso amarelo e bochechas vermelho-melancia. Provavelmente, alguém filmou. Para usar em alguma manipulação de satisfação comprovada – talvez, porque nesta rua haja propaganda de segurança privada: olhem como as pessoas andam e são felizes, pois sentem segurança e liberdade. Dias depois, numa sessão mediúnica, recebi mensagem anônima: as pessoas que monitoraram a minha invasão, pequena possessão muscular, perceberam minha resistência e praguejaram o fracasso, o sorriso fora falso. Sorri e ri, até, com aquela sinceridade que arregaça as veias. Orei e prometi resistência. Gargalharei de vitória cada vez que eu não sorrir. Com os punhos fechados eu saí da sessão. E orei como oram as harpias, com as plumas eriçadas.  
 
 
 
 
2020/07/05   
Fred

Vento alpha

 
Sozinha entre unhas brancas há uma pintada de galáxia dourada e muitas estrelas pretas, juntas entregam pastéis e molho de pimenta vermelha. Uma senhora sonha com o frio-da-europa. Pastéis de carne macia, de animais confinados. As pessoas estão muita próximas, por isso qualquer lugar fica pequeno. Novas cepas de fungos, vírus e bactérias põem uma distopia em fase de prelúdio. Uma senhora tem o corpo todo salpicado de microplástico. Será incrível quando os Glaucus atlanticus e os Dragões-marinhos-folhados forem enormes e puderem voar. Músicas e marmitas, gratuitas, continuam salvando vidas, continuam a impressionar. Uma ficha de tamanho incomum continua caindo e, de vez em quando, alguns transeuntes param para observar; os mesmos alguns, de vez em quando, pensam em voz alta se aquilo é um truque, olham em volta, porque a força da gravidade já deveria ter derrubado a ficha no chão - “certo?”. Ventos longos, da espessura de bairros inteiros; rios transbordam, ciclones bomba, relampeios. Tucanos de bico verde, de peito branco, de bico preto, tucanos. Da matilha, primeiro veio o vento alpha, mais longo, depois os menores e mais sinuosos, assustadores, frios, uivantes, terríveis e maravilhosos – bagunçaram e espalharam, para que todos pudessem respeitá-los. 

Não duvide das distopias: assim sussurram elas por meio de memes e gifs.  Acabou, assim, aquele dia emendando na madrugada, que seguiu igual – do amendoado para o breu.  

 
 
 
2020/07/01  
Fred