segunda-feira, 25 de maio de 2009

Tecobe - A fruta desconhecida

todo mundo queria ter um pé de tecobe em casa

porque nascia em qualquer lugar
porque quem comia não precisava comer mais nada
e nem tomaria água
tecobe saciava

o frescor da casca
a polpa suculenta
e aquele doce nutritivo que amamenta
as cores cintilantes
pululantes saltitantes
parecia eletrônica
caleidoscópica
viva e animada
se mexia
parecia bicho pulsante

a tecobe aparecia
em todo tipo de chão
em todo tipo de casa
em todo tipo de barriga

aonde jogasse nascia
plantasse crescia
a tecobe brotava em qualquer deserto
aonde tivesse terra ela permaneceria

e aonde se jogou a semente
em dois dias veio à luz do dia

...

descobriram que ela saciava
matava a sede de água e de comida
matava as diferenças nas cidades
nas montanhas e pradarias

e acabou a fome
acabou a desigualdade
quem sentisse necessidade
descia o dente na tecobe

e desciam os dentes na tecobe
a gente pobre e a rica
acabou o domínio
acabou a apatia
a tecobe levantava tudo
e ninguém de ninguém dependia

e houve a revolução
a independência existia
quem quisesse o que quisesse
sua vida inteira dedicaria

...

a tecobe só não mudou a morte
que continuou bem viva
mas começaram outros tempos
aonde passar necessidade não existia

alguns se conformaram
para outros de nada adiantaria
continuaram reclamando da vida
que sempre terminaria na morte
e sabiam que esse ciclo nunca cessaria




Fred - 20/09/2007
Coleção Delirium - Música
Da língua Tupi: tecobe = vida

3 comentários:

Bruno Maiorquino* disse...

Uma vez esclarecido o significado de "tecobe", vida em tupi, o conteúdo dos versos me lembrou duas coisas: no começo do texto, vejo essa espécie de inevitabilidade da vida, que existe quase que por si, por existir, uma gênese independente, que nasce em qualquer lugar, alimenta, sacia, de maneira esplendorosa, suculenta, pulsante, como as vontades e sonhos que dão movimento e beleza à vida (acho que essa concepção do surgimento da vida também se aproxima bastante das explicações que a ciência dá hoje em dia: minerais que com as radiações solares e o calor se desenvolveram em elementos orgânicos, que se transformaram em aminoácidos, formando proteínas, células, e mais células, e plantas, animais e pessoas... ou seja, um desenvolvimento meio que fortuito, mas de forma causal).
A segunda coisa, que está mais presente no processo que vai do meio do texto até o fim, é a idéia da vida como uma dádiva, uma graça, capaz de revolucionar e promover o bem-estar geral - justamente por seus atributos de existência perfeita e completa -, mas que, no entanto, pode ser deturpada e corrompida quando se tem na morte a interrupção da vida e a continuação de um ciclo aonde os atributos da vida são insuficientes por serem perecíveis.

O exemplo dessas idéias que me veio imediatamente à cabeça é o filme "Dogville", aonde o surgimento da personagem "Grace" (graça) traz boas mudanças para o vilarejo, mas que depois é desvirtuada pela índole perversa dos moradores.
É um ótimo filme, que também traz uma proposta estética diferente - e poderosa. Fica aí a sugestão.


Nossa, quanta coisa!

Valew!

Fred - Grafiq disse...

Valews pelos comentários e análises.
Quanto ao filme: é muito bom mesmo. Foi um marco e se assistido mais de uma vez alguns detalhes surgem, umas sutilezas.
Bacana.

Abs

Luciana disse...

Ao ler o texto desejei profundamente esta fruta e ao final percebi como nã nos damos conta de que a sememte está dentro de nós, apesar de não a semearmos...Talvez vivamos sem conhecer seus frutos e flores, isso tudo porque não sabemos cultivá-la!

Amei!
Te amo!