quarta-feira, 17 de junho de 2009

Coleiras

e quando nossas células se confundirem com robôs
proteínas com nanoestruturas de carbono e outros
e quando defecarmos robôs
e forem eles os pequenos funcionários nanoconscientes
a aprender com milhões de outros seres veteranos em nós
e quando almas portáteis estiverem respeitosamente disponíveis
e estabelecermos telepatia por meio de botões
e olharmos o passado como um conto de bruxas
e quando sensores detectarem e transformarem em imagens
qualquer oscilação de humor e intenções
e relatórios traduzidos em gráficos mostrarem
o que senti quando descobri que me vigiavam,
quais minhas crenças, meus planos e projeções sobre o futuro

e quando alguém lhe perguntar e você tiver que tomar uma posição para responder
e quando robôs forem sutis
e parecerem corpos espirituais de tão delicados
e não forem mais robôs, mas tiverem um nome que não sabemos agora
e tocarem nossa alma como os dedos se tocam
e quando não lembrarmos tudo o que queremos dizer porque queremos responder tudo em uma única palavra...

e quando amar a vida for difícil porque podemos explodir de tanto contentamento
e a tecnologia nos descortinar QUALQUER COISA
e essa COISA QUALQUER mesmo sendo vista for incompreensível
e não tivermos alternativa a não ser sermos compreensivos
e a ficção científica servir para identificar somente quais as esperanças do autor
e a poesia for suficiente para dias de reflexão
e uma frase lhe tomar a mente por um dia inteiro
e concentrar-se for questão de sobrevivência
e sempre precisarmos reler porque nossa compreensão estará quantificada
no visor do monitor
reler porque nossa compreensão estará quantificada no visor do monitor
reler e compreender no visor do monitor
reler e compreender o monitor

e
filosoficamente póshumanos e préespirituais
inevitavelmente opacos de corpo
e transparentes de alma
traduzíveis energeticamente
decifrados geneticamente

e quem estiver no poder tiver toda razão do mundo para estar
e resistirmos para sermos seus irmãos...
teremos argumentos?


Fred - 04/06/2009
Coleção Híbridos

3 comentários:

Bruno Maiorquino* disse...

Em primeiro lugar: que desenho mais cabuloso! Seus grafites são realmente incríveis, uma atração à parte. Adoraria poder relacioná-lo mais precisamente com o texto escrito, e assim ter uma noção mais clara da unidade que os dois formam; mas, infelizmente, minha leitura de imagens não é tão razoável como a de palavras. Se você pudesse me dizer alguma coisa sobre a construção conceitual e formal de seus desenhos, seria um grande aprendizado pra mim!
Quanto aos versos, adoro esse seu projeto de fundir temas como a natureza e a tecnologia, a máquina e o homem, o passado e o futuro, a imagem e a palavra. Na verdade, mais do que gosto: acho isso importantíssimo! Só o gênio de um verdadeiro poeta, visionário ou qualquer coisa que o valha, é sensível o suficiente para percerber os estímulos e as transformações enquanto elas acontecem, sendo, portanto, efetivamente atuais, e para mim, é essa tarefa de tentar expressar o tumulto de nossas vidas e o rumo que ela pode seguir que você consegue cumprir com uma bela eficiência artística.

Parabéns, meu caro, sempre!

Abraço!

Fred - Grafiq disse...

Olá meu caro Bruno.
Obrigado pela sua generosidade nos comentários. Fiquei surpreso pelos elogios e pelo interesse nesse poema; tanto você como os outros que comentaram gostaram bastante.
No que se refere à imagem: Coleiras nasceu da relação que existe entre dominação e alguma utilidade de aprendizado que possa ser relacionada com essa dominação; como ponto de partida para a contrução da ilustração pesquisei algumas fotos e textos que falassem dos homens-hiena da Nigéria. As linhas e cores são referências mais tribais e sugerindo a fluência de "energias" que nos compõem, envolvem e são produzidas por nós - sem querer me alongar e explicar, o que acho que tiraria a graça da interpretação de quem lesse, e até limitaria as sensações e conexões que cada um constrói dentro de si.
Resumidamente: o texto e a imagem apontam para questões sobre tecnologia, dominação, aprendizado com a dureza que estas esferas podem oferecer e o resto é com o leitor.
Se lembrar de mais alguma coisa eu te falo.
Rrrsss.
Obrigado pela visita.
Abs

Rodrigo disse...

Fantástico! Forte!
Gostaria de voltar todos os dias aqui, nesse texto, e comentar passagem por passagem...seu texto é muitos!

"e a tecnologia foi descortinar QUALQUER COISA
e essa COISA QUALQUER mesmo sendo vista for incompreensível"
Tomara assim seja!!

Abraço!!!